Carlão Tratsk e a concretização de um sonho que resistiu ao tempo
Hoje, Carlão estaria completando 83 anos de vida. Antes de partir, concluiu sua obra o Dicionário da Larfiagem.
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Os trilhos que serpenteiam pelas encostas dos morros tingidos pelo verde da mata nativa, e que se erguem do lado esquerdo do Rio do Peixe, abriam passagem para que a Maria Fumaça deslizasse em ritmo cadenciado pelo coração de Herval d´Oeste, embalando em sua trajetória, o sonho de muitas pessoas que desembarcavam na estação, fincavam suas raízes no Vale do Rio do Peixe, e como árvores frondosas, cresciam e davam frutos.
E foi navegando em aspirações e desejos que Wassil Tratsk, um ucraniano que chegou ao Brasil quando tinha apenas 5 anos, e sua esposa Araci, uma imigrante italiana, desembarcaram na estação de Herval d`Oeste, vindo de Jaguariaíva, no Paraná.
O destino, com suas artimanhas sutis, em alguns momentos assemelha-se a um mago que debruça seu olhar sobre a estrada que atravessa o tempo, vislumbrando o futuro. E, munido desse conhecimento, faz brotar o presente.
Assim, a casa que acolheu o casal Wassil e Araci e que testemunhou o nascimento de seu filho Carlos Adão, foi erguida exatamente no local onde, um dia, se ergueria a sede de sua amada escola de samba: a Unidos do Herval, à qual Carlão, como ficou popularmente conhecido, foi um dos seus fundadores, dedicando-lhe empenho e carinho, e sempre carregando-a do lado esquerdo do peito.
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A infância, palco onde a alegria encontra abrigo e inspira o desabrochar da criatividade, foi também para o filho do casal Tratsk, o momento de compreender o valor do trabalho, e a importância de ter suas próprias moedas.
Entre os passos dos viajantes que chegavam e saíam da cidade, misturavam-se os passos de moleques que, em busca de alguns trocados dos aventureiros, faziam da estação ferroviária seu ponto de trabalho.
A necessidade de uma forma de comunicação exclusiva entre esses garotos deu origem à Larfiagem, a língua hervalense. E foi nesse cenário que Carlão, um desses meninos, fundiu a sua própria história com a de Herval d’Oeste.
A Larfiagem tornou-se parte da identidade cultural do município. Não há como falar da cultura hervalense sem citar a língua criada por engraxates, vendedores ambulantes e carregadores de malas, na década de 50. E Tratsk foi um dos seus mentores.
Hoje, Carlão estaria completando 83 anos de vida, entretanto, no dia 26 de dezembro de 2023, a história de um dos hervalenses mais ilustres, recebeu um ponto final.
Carlão viveu sua vida intensamente. A alegria contagiante e a humildade eram características peculiares de sua personalidade, e se misturavam com o apreço que tinha pelos amigos, vizinhos e por todo povo de sua terra. O alto astral, presente em seu dia a dia, contagiava as pessoas ao seu redor e, por onde passava, deixava um rastro de felicidade.
Falava e escrevia fluentemente a língua que ajudou a criar, e tinha um ideal, escrever e publicar um dicionário de Larfiagem.
Antes de partir, concluiu sua obra, e o próximo passo seria editar e lançar seu sonhado livro.
O destino, dono de si próprio, acabou não reservando tempo suficiente para que Tratsk concretizasse seu ideal. Sua família, porém, abraçou esse propósito e, neste dia 2 de março, domingo de Carnaval, as 16h, a Estação Ferroviária de Herval d’Oeste – o mesmo local que testemunhou o nascimento da Larfiagem – vai testemunhar a concretização do sonho de um dos seus criadores.
O sonho de um hervalense que, em muitos momentos de sua jornada, fundiu sua própria história com a da terra onde nasceu.
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Texto escrito pelo produtor cultural Omar Dimbarre
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